Rio de Janeiro, Brasil

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3.2.09 ------------

O Captain! My Captain!

Walt Whitman


1

O CAPTAIN! my Captain! our fearful trip is done;
The ship has weather’d every rack, the prize we sought is won;
The port is near, the bells I hear, the people all exulting,
While follow eyes the steady keel, the vessel grim and daring:
But O heart! heart! heart!
O the bleeding drops of red,
Where on the deck my Captain lies,
Fallen cold and dead.

2

O Captain! my Captain! rise up and hear the bells;
Rise up—for you the flag is flung—for you the bugle trills;
For you bouquets and ribbon’d wreaths—for you the shores a-crowding;
For you they call, the swaying mass, their eager faces turning;
Here Captain! dear father!
This arm beneath your head;
It is some dream that on the deck,
You’ve fallen cold and dead.

3

My Captain does not answer, his lips are pale and still;
My father does not feel my arm, he has no pulse nor will;
The ship is anchor’d safe and sound, its voyage closed and done;
From fearful trip, the victor ship, comes in with object won;
Exult, O shores, and ring, O bells!
But I, with mournful tread,
Walk the deck my Captain lies,
Fallen cold and dead.

3.2.09 

8.1.08 ------------

In Memory of W. B. Yeats
by W. H. Auden




I


He disappeared in the dead of winter:

The brooks were frozen, the airports almost deserted,

And snow disfigured the public statues;

The mercury sank in the mouth of the dying day.

What instruments we have agree

The day of his death was a dark cold day.



Far from his illness

The wolves ran on through the evergreen forests,

The peasant river was untempted by the fashionable quays;

By mourning tongues

The death of the poet was kept from his poems.



But for him it was his last afternoon as himself,

An afternoon of nurses and rumours;

The provinces of his body revolted,

The squares of his mind were empty,

Silence invaded the suburbs,

The current of his feeling failed; he became his admirers.



Now he is scattered among a hundred cities

And wholly given over to unfamiliar affections,

To find his happiness in another kind of wood

And be punished under a foreign code of conscience.

The words of a dead man

Are modified in the guts of the living.



But in the importance and noise of to-morrow

When the brokers are roaring like beasts on the floor of the Bourse,

And the poor have the sufferings to which they are fairly accustomed,

And each in the cell of himself is almost convinced of his freedom,

A few thousand will think of this day

As one thinks of a day when one did something slightly unusual.



What instruments we have agree

The day of his death was a dark cold day.





II


You were silly like us; your gift survived it all:

The parish of rich women, physical decay,

Yourself. Mad Ireland hurt you into poetry.

Now Ireland has her madness and her weather still,

For poetry makes nothing happen: it survives

In the valley of its making where executives

Would never want to tamper, flows on south

From ranches of isolation and the busy griefs,

Raw towns that we believe and die in; it survives,

A way of happening, a mouth.







III


Earth, receive an honoured guest:

William Yeats is laid to rest.

Let the Irish vessel lie

Emptied of its poetry.



In the nightmare of the dark

All the dogs of Europe bark,

And the living nations wait,

Each sequestered in its hate;



Intellectual disgrace

Stares from every human face,

And the seas of pity lie

Locked and frozen in each eye.



Follow, poet, follow right

To the bottom of the night,

With your unconstraining voice

Still persuade us to rejoice;



With the farming of a verse

Make a vineyard of the curse,

Sing of human unsuccess

In a rapture of distress;



In the deserts of the heart

Let the healing fountain start,

In the prison of his days

Teach the free man how to praise.

8.1.08 

3.10.05 ------------

Oops...

O Blogger está fora do ar. Consegui subir os posts abaixo através do w.bloggar -- que mesmo assim deu repeteco nos "Companheiros de Viagem" -- mas não posso subir imagens através dele. Madrugada vai alta, estou cansada de tentar acessar o Blogger, que não dá sinal de vida; depois conserto isso aí e subo as fotos, OK?

3.10.05 

19.9.04 ------------

Genesis

Jorge de Sena

De mim não falo mais :não quero nada.
De Deus não falo:não tem outro abrigo.
Não falarei também do mundo antigo,
pois nasce e morre em cada madrugada.

Nem de existir,que é a vida atraiçoada,
para sentir o tempo andar comigo;
nem de viver,que é liberdade errada,
e foge todo o Amor quando o persigo.

Por mais justiça ...-Ai quantos que eram novos
em vâo a esperaram porque nunca a viram!
E a eternidade...Ó transfusâo dos povos!

Não há verdade:O mundo não a esconde.
Tudo se vê: só se não sabe aonde.
Mortais ou imortais,todos mentiram.

19.9.04 

Il bove

Giosuè Carducci


T'amo, o pio bove; e mite un sentimento
Di vigore e di pace al cor m' infondi,
O che solenne come un monumento
Tu guardi i campi liberi e fecondi,

O che al giogo inchinandoti contento
L'agil opra de l'uom grave secondi:
Ei t'esorta e ti punge, e tu co 'l lento
Giro di pazienti occhi rispondi.

Da la larga narice umida e nera
Fuma il tuo spirto, e come un inno lieto
Il mugghio nel sereno aèr si perde;

E del grave occhio glauco entro l'austera
Dolcezza si rispecchia ampio e quieto
Il divino del pian silenzio verde.

19.9.04 



Relendo Jorge de Sena

Cada vez que leio Jorge de Sena descubro uma coisa nova, ou uma coisa antiga que me impressiona de maneira nova.


Genesis

De mim não falo mais: não quero nada.
De Deus não falo: não tem outro abrigo.
Não falarei também do mundo antigo,
pois nasce e morre em cada madrugada.

Nem de existir, que é a vida atraiçoada,
para sentir o tempo andar comigo;
nem de viver, que é liberdade errada,
e foge todo o Amor quando o persigo.

Por mais justiça... -- Ai quantos que eram novos
em vâo a esperaram porque nunca a viram!
E a eternidade... Ó transfusâo dos povos!

Não há verdade: o mundo não a esconde.
Tudo se vê: só se não sabe aonde.
Mortais ou imortais, todos mentiram.

(1946)



Fidelidade

Diz-me devagar coisa nenhuma, assim
como a só presença com que me perdoas
esta fidelidade ao meu destino.
Quanto assim não digas é por mim
que o dizes. E os destinos vivem-se
como outra vida. Ou como outra solidão.
E quem lá entra? E quem lá pode estar
mais que o momento de estar só consigo?

Diz-me assim devagar coisa nenhuma:
o que à morte se diria, se ela ouvisse,
ou se diria aos mortos, se voltassem.

(1958)

19.9.04 



Relendo Jorge de Sena

Cada vez que leio Jorge de Sena descubro uma coisa nova, ou uma coisa antiga que me impressiona de maneira nova.

É, com certeza, um dos poetas de que mais gosto.


Genesis

De mim não falo mais: não quero nada.
De Deus não falo: não tem outro abrigo.
Não falarei também do mundo antigo,
pois nasce e morre em cada madrugada.

Nem de existir, que é a vida atraiçoada,
para sentir o tempo andar comigo;
nem de viver, que é liberdade errada,
e foge todo o Amor quando o persigo.

Por mais justiça... -- Ai quantos que eram novos
em vâo a esperaram porque nunca a viram!
E a eternidade... Ó transfusâo dos povos!

Não há verdade: o mundo não a esconde.
Tudo se vê: só se não sabe aonde.
Mortais ou imortais, todos mentiram.

(1946)



Fidelidade

Diz-me devagar coisa nenhuma, assim
como a só presença com que me perdoas
esta fidelidade ao meu destino.
Quanto assim não digas é por mim
que o dizes. E os destinos vivem-se
como outra vida. Ou como outra solidão.
E quem lá entra? E quem lá pode estar
mais que o momento de estar só consigo?

Diz-me assim devagar coisa nenhuma:
o que à morte se diria, se ela ouvisse,
ou se diria aos mortos, se voltassem.

(1958)

19.9.04 

6.9.04 ------------



Aliás...

Como eu publiquei só um trechinho no outro dia, hoje vai a íntegra:

PÁTRIA MINHA
Vinícius de Moraes


A minha pátria é como se não fosse, é íntima
Doçura e vontade de chorar; uma criança dormindo
É minha pátria. Por isso, no exílio
Assistindo dormir meu filho
Choro de saudades de minha pátria.

Se me perguntarem o que é a minha pátria direi:
Não sei. De fato, não sei
Como, por que e quando a minha pátria
Mas sei que a minha pátria é a luz, o sal e a água
Que elaboram e liquefazem a minha mágoa
Em longas lágrimas amargas.

Vontade de beijar os olhos de minha pátria
De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos...
Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias
De minha pátria, de minha pátria sem sapatos
E sem meias pátria minha
Tão pobrinha!

Porque te amo tanto, pátria minha, eu que não tenho
Pátria, eu semente que nasci do vento
Eu que não vou e não venho, eu que permaneço
Em contato com a dor do tempo, eu elemento
De ligação entre a ação o pensamento
Eu fio invisível no espaço de todo adeus
Eu, o sem Deus!

Tenho-te no entanto em mim como um gemido
De flor; tenho-te como um amor morrido
A quem se jurou; tenho-te como uma fé
Sem dogma; tenho-te em tudo em que não me sinto a jeito
Nesta sala estrangeira com lareira
E sem pé-direito.

Ah, pátria minha, lembra-me uma noite no Maine, Nova Inglaterra
Quando tudo passou a ser infinito e nada terra
E eu vi alfa e beta de Centauro escalarem o monte até o céu
Muitos me surpreenderam parado no campo sem luz
À espera de ver surgir a Cruz do Sul
Que eu sabia, mas amanheceu...

Fonte de mel, bicho triste, pátria minha
Amada, idolatrada, salve, salve!
Que mais doce esperança acorrentada
O não poder dizer-te: aguarda...
Não tardo!

Quero rever-te, pátria minha, e para
Rever-te me esqueci de tudo
Fui cego, estropiado, surdo, mudo
Vi minha humilde morte cara a cara
Rasguei poemas, mulheres, horizontes
Fiquei simples, sem fontes.

Pátria minha... A minha pátria não é florão, nem ostenta
Lábaro não; a minha pátria é desolação
De caminhos, a minha pátria é terra sedenta
E praia branca; a minha pátria é o grande rio secular
Que bebe nuvem, come terra
E urina mar.

Mais do que a mais garrida a minha pátria tem
Uma quentura, um querer bem, um bem
Um libertas quae sera tamem
Que um dia traduzi num exame escrito:
"Liberta que serás também"
E repito!

Ponho no vento o ouvido e escuto a brisa
Que brinca em teus cabelos e te alisa
Pátria minha, e perfuma o teu chão...
Que vontade de adormecer-me
Entre teus doces montes, pátria minha
Atento à fome em tuas entranhas
E ao batuque em teu coração.

Não te direi o nome, pátria minha
Teu nome é pátria amada, é patriazinha
Não rima com mãe gentil
Vives em mim como uma filha, que és
Uma ilha de ternura: a Ilha
Brasil, talvez.

Agora chamarei a amiga cotovia
E pedirei que peça ao rouxinol do dia
Que peça ao sabiá
Para levar-te presto este avigrama:
"Pátria minha, saudades de quem te ama...
Vinicius de Moraes."


6.9.04 

4.11.02 ------------



Drummond


As sem-razões do amor

Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamento vários.
Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.
Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.

Sentimento do Mundo

Tenho apenas duas mãos
e o sentimento do mundo,
mas estou cheio escravos,
minhas lembranças escorrem
e o corpo transige
na confluência do amor.

Quando me levantar, o céu
estará morto e saqueado,
eu mesmo estarei morto,
morto meu desejo, morto
o pântano sem acordes.

Os camaradas não disseram
que havia uma guerra
e era necessário
trazer fogo e alimento.
Sinto-me disperso,
anterior a fronteiras,
humildemente vos peço
que me perdoeis.

Quando os corpos passarem,
eu ficarei sozinho
desfiando a recordação
do sineiro, da viúva e do microcopista
que habitavam a barraca
e não foram encontrados
ao amanhecer

esse amanhecer
mais noite que a noite.


Apelo a Meus Dessemelhantes em Favor da paz

Ah, não me tragam originais
para ler, para corrigir, para louvar
sobretudo, para louvar.
não sou leitor do mundo nem espelho
de figuras que amam refleti-se
no outro à falta de retrato interior.
Sou Velho Cansado
que adora o seu cansaço e ano o quer
submisso ao vão comércio da palavra.
Poupem-me, por favor ou por desprezo,
se não querem poupar-me por amor.
Não leio mais, não posso, que este tempo
a mim distribuído
cai do ramo e azuleja o chão varrido,
chão tão limpo de ambição
que minha só leitura é ler o chão.
Nem sequer li os textos das pirâmides
os textos dos sarcófagos,
estou atrasadíssimo nos gregos,
não conheço os Anais de Assurbanipal,
como é que vou-
mancebos,
senhoritas
-chegar à poesia de vanguarda
e às glórias de 2.000, que telefonam?
Passam gênios talvez entre as acácias,
Sinto estátuas futuras as moldando
sem precisão de mim
que quando jovem (fui-o a. C., believe or not)
nunca pulei muro de jardim
para exigir do morador tranqüilo
a canonização do meu estilo.
Sirvam-se de exonerar este macróbio
do penoso exercício literário.
Não exijam prefácios e posfácios
ao ancião que mais fala quando cala.
Brotos de coxa flava e verso manco,
poetas de barba-colar e velutínea
calça puida, verde:tá!
Outoniços, crepusculinos, matronas, contumazes:
Tá!
O senhor saiu. Hora que volta? Nunca.
Nunca de corvo, nunca de São-Nunca.
Saiu pra não voltar.
Tudo esqueceu: responder
cartas; sorrir
Cumplicemente; agradecer
dedicatórias; retribuir
boas-festas; ir ao coquetel e à noite
de autografos-com-pastorinhas.
Ficou assim: o cacto de Manuel
é uma suavidade perto dele.
Respeitem a fera.Triste, sem presas, é fera.
Na jaula do mundo passeia a pata aplastante,
Cuidado com ela!
Vocês, garotos de colégio, não perguntem ao poeta
Quando nasceu.
Ele não nasceu.
Não vai nascer mais.
Desistiu de nascer quando viu que o esperavam garotos de colégio de lápis
[em punho
com professores na retaguarda comandando: Cacem o urso-polar,
tragam-no vivo para fazer uma conferencia.
Repórteres de vespertinos, não tentem entrevista-lo.
Não lhe, não me peçam opinião
que é impublicavel qualquer que seja o fato de dia
e contraditória e louca antes da formulada.
Fotógrafos: não adianta
pedir pose junto ao oratória de Cocais
nem folheando o álbum de portinari
nem tomando banho de chuveiro.
Sou contra Niepce, Daguerre, contra principalmente minha imagem.
Não quero oferecer minha cara como verônica nas revistas.
Quero a paz das estepes
a paz descampados
a paz do Pico de Itabira quando havia Pico de Itabira
a paz de cima da Agulhas Negras
a paz de muito baixo de mina mais funda e esboroada de morro velho
a paz
da
paz


Não se mate

Carlos, sossegue, o amor
é isso que você está vendo:
hoje beija, amanhã não beija,
depois de amanhã é domingo
e segunda-feira ninguém sabe
o que será.

Inútil você resistir
ou mesmo suicidar-se.
Não se mate, oh não se mate,
reserve-se todo para
as bodas que ninguém sabe
quando virão,
se é que virão.

O amor, Carlos, você telúrico,
a noite passou em você,
e os recalques se sublimando,
lá dentro um barulho inefável,
rezas,
vitrolas,
santos que se persignam,
anúncios do melhor sabão,
barulho que ninguém sabe
de quê, praquê.

Entretanto você caminha
melancólico e vertical.
Você é a palmeira, você é o grito
que ninguém ouviu no teatro
e as luzes todas se apagam.
O amor no escuro, não, no claro,
é sempre triste, meu filho, Carlos,
mas não diga nada a ninguém,
ninguém sabe nem saberá.


Consolo na praia

Vamos, não chores...
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.

O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.

Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis casa, navio, terra.
Mas tens um cão.

Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humour?

A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.

Tudo somado, devias
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento...
Dorme, meu filho.

4.11.02 

26.7.02 ------------

Excerto de Ode

Álvaro de Campos
Vem, Noite antiquíssima e idêntica,
Noite Rainha nascida destronada,
Noite igual por dentro ao silêncio, Noite
Com as estrelas lentejoulas rápidas
No teu vestido franjado de Infinito.

Vem, vagamente,
Vem, levemente,
Vem sozinha, solene, com as mãos caídas
Ao teu lado, vem
E traz os montes longínquos para o pé das árvores próximas,
Funde num campo teu todos os campos que vejo,
Faze da montanha um bloco só do teu corpo,
Apaga-lhe todas as diferenças que de longe vejo,
Todas as estradas que a sobem,
Todas as várias árvores que a fazem verde-escuro ao longe.
Todas as casas brancas e com fumo entre as árvores,
E deixa só uma luz e outra luz e mais outra,
Na distância imprecisa e vagamente perturbadora,
Na distância subitamente impossível de percorrer.

Nossa Senhora
Das coisas impossíveis que procuramos em vão,
Dos sonhos que vêm ter conosco ao crepúsculo, à janela,
Dos propósitos que nos acariciam
Nos grandes terraços dos hotéis cosmopolitas
Ao som europeu das músicas e das vozes longe e perto,
E que doem por sabermos que nunca os realizaremos...
Vem, e embala-nos,
Vem e afaga-nos.
Beija-nos silenciosamente na fronte,
Tão levemente na fronte que não saibamos que nos beijam
Senão por uma diferença na alma.
E um vago soluço partindo melodiosamente
Do antiquíssimo de nós
Onde têm raiz todas essas árvores de maravilha
Cujos frutos são os sonhos que afagamos e amamos
Porque os sabemos fora de relação com o que há na vida.

Vem soleníssima,
Soleníssima e cheia
De uma oculta vontade de soluçar,
Talvez porque a alma é grande e a vida pequena,
E todos os gestos não saem do nosso corpo
E só alcançamos onde o nosso braço chega,
E só vemos até onde chega o nosso olhar.

Vem, dolorosa,
Mater-Dolorosa das Angústias dos Tímidos,
Turris-Eburnea das Tristezas dos Desprezados,
Mão fresca sobre a testa em febre dos humildes,
Sabor de água sobre os lábios secos dos Cansados.
Vem, lá do fundo
Do horizonte lívido,
Vem e arranca-me
Do solo de angústia e de inutilidade
Onde vicejo.
Apanha-me do meu solo, malmequer esquecido,
Folha a folha lê em mim não sei que sina
E desfolha-me para teu agrado,
Para teu agrado silencioso e fresco.
Uma folha de mim lança para o Norte,
Onde estão as cidades de Hoje que eu tanto amei;
Outra folha de mim lança para o Sul,
Onde estão os mares que os Navegadores abriram;
Outra folha minha atira ao Ocidente,
Onde arde ao rubro tudo o que talvez seja o Futuro,
Que eu sem conhecer adoro;
E a outra, as outras, o resto de mim
Atira ao Oriente,
Ao Oriente donde vem tudo, o dia e a fé,
Ao Oriente pomposo e fanático e quente,
Ao Oriente excessivo que eu nunca verei,
Ao Oriente budista, bramânico, sintoísta,
Ao Oriente que tudo o que nós não temos,
Que tudo o que nós não somos,
Ao Oriente onde — quem sabe? — Cristo talvez ainda hoje viva,
Onde Deus talvez exista realmente e mandando tudo...

Vem sobre os mares,
Sobre os mares maiores,
Sobre os mares sem horizontes precisos,
Vem e passa a mão pelo dorso da fera,
E acalma-o misteriosamente,
ó domadora hipnótica das coisas que se agitam muito!

Vem, cuidadosa,
Vem, maternal,
Pé ante pé enfermeira antiquíssima, que te sentaste
À cabeceira dos deuses das fés já perdidas,
E que viste nascer Jeová e Júpiter,
E sorriste porque tudo te é falso é inútil.

Vem, Noite silenciosa e extática,
Vem envolver na noite manto branco
O meu coração...
Serenamente como uma brisa na tarde leve,
Tranqüilamente com um gesto materno afagando.
Com as estrelas luzindo nas tuas mãos
E a lua máscara misteriosa sobre a tua face.
Todos os sons soam de outra maneira
Quando tu vens.
Quando tu entras baixam todas as vozes,
Ninguém te vê entrar.
Ninguém sabe quando entraste,
Senão de repente, vendo que tudo se recolhe,
Que tudo perde as arestas e as cores,
E que no alto céu ainda claramente azul
Já crescente nítido, ou círculo branco, ou mera luz nova que vem.

A lua começa a ser real.

26.7.02 

7.3.02 ------------

ELEGY XX

To His Mistress Going To Bed


John Donne


COME, madam, come, all rest my powers defy ;
Until I labour, I in labour lie.
The foe ofttimes, having the foe in sight,
Is tired with standing, though he never fight.
Off with that girdle, like heaven's zone glittering,
But a far fairer world encompassing.
Unpin that spangled breast-plate, which you wear,
That th' eyes of busy fools may be stopp'd there.
Unlace yourself, for that harmonious chime
Tells me from you that now it is bed-time.
Off with that happy busk, which I envy,
That still can be, and still can stand so nigh.
Your gown going off such beauteous state reveals,
As when from flowery meads th' hill's shadow steals.
Off with your wiry coronet, and show
The hairy diadems which on you do grow.
Off with your hose and shoes ; then softly tread
In this love's hallow'd temple, this soft bed.
In such white robes heaven's angels used to be
Revealed to men ; thou, angel, bring'st with thee
A heaven-like Mahomet's paradise ; and though
Ill spirits walk in white, we easily know
By this these angels from an evil sprite ;
Those set our hairs, but these our flesh upright.
Licence my roving hands, and let them go
Before, behind, between, above, below.
O, my America, my Newfoundland,
My kingdom, safest when with one man mann'd,
My mine of precious stones, my empery ;
How am I blest in thus discovering thee !
To enter in these bonds, is to be free ;
Then, where my hand is set, my soul shall be.
Full nakedness ! All joys are due to thee ;
As souls unbodied, bodies unclothed must be
To taste whole joys. Gems which you women use
Are like Atlanta's ball cast in men's views ;
That, when a fool's eye lighteth on a gem,
His earthly soul might court that, not them.
Like pictures, or like books' gay coverings made
For laymen, are all women thus array'd.
Themselves are only mystic books, which we
—Whom their imputed grace will dignify—
Must see reveal'd. Then, since that I may know,
As liberally as to thy midwife show
Thyself ; cast all, yea, this white linen hence ;
There is no penance due to innocence :
To teach thee, I am naked first ; why then,
What needst thou have more covering than a man?

7.3.02 

25.2.02 ------------

LISBON REVISITED

Álvaro de Campos

Não: não quero nada,
Já disse que não quero nada.

Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.

Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!)
Das ciências, das artes, da civilização moderna!

Que mal fiz eu aos deuses todos?
Se têm a verdade, guardem-a!

Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito de sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havermos de ir juntos?

Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!

Ó céu azul – o mesmo da minha infância –
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.

Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!

25.2.02 

16.9.01 ------------

Motivo



Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
Sou poeta.


Irmão das coisas fugidias
Não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.


Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.


Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno e asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.

Cecília Meireles



16.9.01 

9.9.01 ------------



Let something happen
Something be said
Someone in the middle
Of this polite muttering
Scream about the dead
Come, history
Into our smiling
Gentle whiling
Away of our time
Kick a broken head
Into the circle of our
Casual night of talking
Gently, politely, casually
Come reality and dread.

Howard Brenton



9.9.01 

4.9.01 ------------

Curiosity



may have killed the cat; more likely
the cat was just unlucky, or else curious
to see what death was like, having no cause
to go on licking paws, or fathering
litter on litter of kittens, predictably.

Nevertheless, to be curious
is dangerous enough. To distrust
what is always said, what seems,
to ask odd questions, interfere in dreams,
leave home, smell rats, have hunches
do not endear cats to those doggy circles
where well-smelt baskets, suitable wives, good lunches
are the order of things, and where prevails
much wagging of incurious heads and tails.

Face it. Curiosity
will not cause us to die--
only lack of it will.
Never to want to see
the other side of the hill
or that improbable country
where living is an idyll
(although a probable hell)
would kill us all.Only the curious have, if they live, a tale
worth telling at all.

Dogs say cats change too much, are irresponsible,
are changeable, marry too many wives,
desert their children, chill all dinner tables
with tales of their nine lives.
Well, they are lucky. Let them be
nine-lived and contradictory,
curious enough to change, prepared to pay
the cat price, which is to die
and die again and again,
each time with no less pain.
A cat minority of one
is all that can be counted on
to tell the truth. And what cats have to tell
on each return from hell
is this: that dying is what the living do,
that dying is what the loving do,
and that dead dogs are those who do not know
that dying is what, to live, each has to do.

Alastair Reid

4.9.01 

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