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19.9.04
GenesisJorge de Sena
De mim não falo mais :não quero nada.
De Deus não falo:não tem outro abrigo.
Não falarei também do mundo antigo,
pois nasce e morre em cada madrugada.
Nem de existir,que é a vida atraiçoada,
para sentir o tempo andar comigo;
nem de viver,que é liberdade errada,
e foge todo o Amor quando o persigo.
Por mais justiça ...-Ai quantos que eram novos
em vâo a esperaram porque nunca a viram!
E a eternidade...Ó transfusâo dos povos!
Não há verdade:O mundo não a esconde.
Tudo se vê: só se não sabe aonde.
Mortais ou imortais,todos mentiram.
19.9.04
Il boveGiosuè Carducci
T'amo, o pio bove; e mite un sentimento
Di vigore e di pace al cor m' infondi,
O che solenne come un monumento
Tu guardi i campi liberi e fecondi,
O che al giogo inchinandoti contento
L'agil opra de l'uom grave secondi:
Ei t'esorta e ti punge, e tu co 'l lento
Giro di pazienti occhi rispondi.
Da la larga narice umida e nera
Fuma il tuo spirto, e come un inno lieto
Il mugghio nel sereno aèr si perde;
E del grave occhio glauco entro l'austera
Dolcezza si rispecchia ampio e quieto
Il divino del pian silenzio verde.
19.9.04
Relendo Jorge de SenaCada vez que leio Jorge de Sena descubro uma coisa nova, ou uma coisa antiga que me impressiona de maneira nova.
Genesis
De mim não falo mais: não quero nada. De Deus não falo: não tem outro abrigo. Não falarei também do mundo antigo, pois nasce e morre em cada madrugada.
Nem de existir, que é a vida atraiçoada, para sentir o tempo andar comigo; nem de viver, que é liberdade errada, e foge todo o Amor quando o persigo.
Por mais justiça... -- Ai quantos que eram novos em vâo a esperaram porque nunca a viram! E a eternidade... Ó transfusâo dos povos!
Não há verdade: o mundo não a esconde. Tudo se vê: só se não sabe aonde. Mortais ou imortais, todos mentiram.
(1946)
Fidelidade
Diz-me devagar coisa nenhuma, assim como a só presença com que me perdoas esta fidelidade ao meu destino. Quanto assim não digas é por mim que o dizes. E os destinos vivem-se como outra vida. Ou como outra solidão. E quem lá entra? E quem lá pode estar mais que o momento de estar só consigo?
Diz-me assim devagar coisa nenhuma: o que à morte se diria, se ela ouvisse, ou se diria aos mortos, se voltassem.
(1958)
19.9.04
Relendo Jorge de SenaCada vez que leio Jorge de Sena descubro uma coisa nova, ou uma coisa antiga que me impressiona de maneira nova.
É, com certeza, um dos poetas de que mais gosto.
Genesis
De mim não falo mais: não quero nada. De Deus não falo: não tem outro abrigo. Não falarei também do mundo antigo, pois nasce e morre em cada madrugada.
Nem de existir, que é a vida atraiçoada, para sentir o tempo andar comigo; nem de viver, que é liberdade errada, e foge todo o Amor quando o persigo.
Por mais justiça... -- Ai quantos que eram novos em vâo a esperaram porque nunca a viram! E a eternidade... Ó transfusâo dos povos!
Não há verdade: o mundo não a esconde. Tudo se vê: só se não sabe aonde. Mortais ou imortais, todos mentiram.
(1946)
Fidelidade
Diz-me devagar coisa nenhuma, assim como a só presença com que me perdoas esta fidelidade ao meu destino. Quanto assim não digas é por mim que o dizes. E os destinos vivem-se como outra vida. Ou como outra solidão. E quem lá entra? E quem lá pode estar mais que o momento de estar só consigo?
Diz-me assim devagar coisa nenhuma: o que à morte se diria, se ela ouvisse, ou se diria aos mortos, se voltassem.
(1958)
19.9.04
6.9.04
Aliás...Como eu publiquei só um trechinho no outro dia, hoje vai a íntegra:
PÁTRIA MINHA Vinícius de Moraes
A minha pátria é como se não fosse, é íntima Doçura e vontade de chorar; uma criança dormindo É minha pátria. Por isso, no exílio Assistindo dormir meu filho Choro de saudades de minha pátria.
Se me perguntarem o que é a minha pátria direi: Não sei. De fato, não sei Como, por que e quando a minha pátria Mas sei que a minha pátria é a luz, o sal e a água Que elaboram e liquefazem a minha mágoa Em longas lágrimas amargas.
Vontade de beijar os olhos de minha pátria De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos... Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias De minha pátria, de minha pátria sem sapatos E sem meias pátria minha Tão pobrinha!
Porque te amo tanto, pátria minha, eu que não tenho Pátria, eu semente que nasci do vento Eu que não vou e não venho, eu que permaneço Em contato com a dor do tempo, eu elemento De ligação entre a ação o pensamento Eu fio invisível no espaço de todo adeus Eu, o sem Deus!
Tenho-te no entanto em mim como um gemido De flor; tenho-te como um amor morrido A quem se jurou; tenho-te como uma fé Sem dogma; tenho-te em tudo em que não me sinto a jeito Nesta sala estrangeira com lareira E sem pé-direito.
Ah, pátria minha, lembra-me uma noite no Maine, Nova Inglaterra Quando tudo passou a ser infinito e nada terra E eu vi alfa e beta de Centauro escalarem o monte até o céu Muitos me surpreenderam parado no campo sem luz À espera de ver surgir a Cruz do Sul Que eu sabia, mas amanheceu...
Fonte de mel, bicho triste, pátria minha Amada, idolatrada, salve, salve! Que mais doce esperança acorrentada O não poder dizer-te: aguarda... Não tardo!
Quero rever-te, pátria minha, e para Rever-te me esqueci de tudo Fui cego, estropiado, surdo, mudo Vi minha humilde morte cara a cara Rasguei poemas, mulheres, horizontes Fiquei simples, sem fontes.
Pátria minha... A minha pátria não é florão, nem ostenta Lábaro não; a minha pátria é desolação De caminhos, a minha pátria é terra sedenta E praia branca; a minha pátria é o grande rio secular Que bebe nuvem, come terra E urina mar.
Mais do que a mais garrida a minha pátria tem Uma quentura, um querer bem, um bem Um libertas quae sera tamem Que um dia traduzi num exame escrito: "Liberta que serás também" E repito!
Ponho no vento o ouvido e escuto a brisa Que brinca em teus cabelos e te alisa Pátria minha, e perfuma o teu chão... Que vontade de adormecer-me Entre teus doces montes, pátria minha Atento à fome em tuas entranhas E ao batuque em teu coração.
Não te direi o nome, pátria minha Teu nome é pátria amada, é patriazinha Não rima com mãe gentil Vives em mim como uma filha, que és Uma ilha de ternura: a Ilha Brasil, talvez.
Agora chamarei a amiga cotovia E pedirei que peça ao rouxinol do dia Que peça ao sabiá Para levar-te presto este avigrama: "Pátria minha, saudades de quem te ama... Vinicius de Moraes."
6.9.04
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